4 Coisas para Pensar Quando o Recém-Nascido Não Fez Cocô
Uma reflexão prática da Pediatria Digital para o diagnóstico diferencial neonatal
🩺 O Caso Clínico
Recém-nascido masculino, 40 horas de vida, nascido de parto vaginal, a termo (39 semanas), filho de primigesta de 28 anos com gravidez sem intercorrências.
O bebê está em aleitamento materno exclusivo, com boa pega e extração visível de colostro após as mamadas. A residente relata que o neonato ainda não evacuou desde o nascimento.
Ao exame:
Estado geral bom
Abdome flácido
Presença de orifício anal aparente
Sem episódios de vômito ou regurgitação
Sem eliminação de mecônio documentada
Diante deste cenário, quais diagnósticos diferenciais devem ser considerados?
🔍 O Básico: Quando Esperar o Primeiro Cocô?
De acordo com um estudo clássico (Clark, 1977), cerca de 99% dos recém-nascidos saudáveis e a termo evacuam nas primeiras 24 horas de vida. Em 48 horas, todos os bebês avaliados haviam evacuado.
No Brasil, diretrizes neonatais reforçam essa observação, apontando que a ausência de eliminação de mecônio até 48h de vida é critério de alerta para investigação de anormalidades intestinais.
🧠 Diagnóstico Diferencial: As 4 Principais Causas
1️⃣ Síndrome do Tampão de Mecônio
Trata-se da causa mais comum e branda de obstrução intestinal distal em neonatos.
É transitória: após a eliminação do tampão, o bebê geralmente passa a evacuar normalmente.
Incidência: 1 a cada 500–1.000 nascidos vivos
Etiologia: mecônio espessado e imóvel, dificultando a evacuação
A estimulação retal com termômetro pode facilitar a liberação do tampão (Loening-Baucke, 1999).
No Brasil, embora não haja dados robustos sobre prevalência, relatos clínicos em hospitais-escola destacam sua presença como causa frequente de atraso na evacuação neonatal.
2️⃣ Íleo Meconial
Uma das principais causas patológicas de obstrução intestinal associada à fibrose cística (FC).
A maioria dos casos de íleo meconial está associada à FC.
FC é uma das doenças genéticas mais comuns em brancos: 1 em 3.200 nascimentos nos EUA.
No Brasil, a triagem neonatal detecta a FC com prevalência estimada de 1:10.000 a 1:15.000 nascidos vivos, com variação regional.
(Fonte: Estudo de Triagem Neonatal no Brasil - Ministério da Saúde)
Recomenda-se sempre verificar se o teste do pezinho do RN inclui rastreio para FC — o que ocorre na maioria dos estados brasileiros.
3️⃣ Doença de Hirschsprung
Distúrbio congênito caracterizado pela ausência de células ganglionares no cólon distal, resultando em incapacidade de peristalse eficaz nessa região.
Prevalência: 1:5.000 nascidos vivos
Predomínio em meninos (relação 4:1)
Associação com Síndrome de Down em 8% dos casos
O reflexo de piscadela anal (contração do esfíncter externo após estimulação perianal com algodão) costuma estar ausente em pacientes com a doença — e sua presença ajuda a afastar o diagnóstico.
Estudos brasileiros apontam que a doença ainda é subdiagnosticada precocemente em algumas regiões, com casos identificados tardiamente após episódios de obstrução intestinal funcional.
4️⃣ Malformações Anorretais (MAR)
Grupo de anomalias congênitas que incluem desde ânus imperfurado até fístulas anorretais complexas.
Incidência: aproximadamente 1:5.000 nascidos vivos
Muitas vezes fazem parte de síndromes mais amplas, como a síndrome VACTERL
O conteúdo publicado anteriormente pela Pediatria Digital explora em detalhes essas anomalias — recomendamos a releitura para aprofundamento.
⚠️ Outras Condições Raras
Apesar de menos frequentes, outras causas podem justificar o atraso na evacuação, como a síndrome do cólon esquerdo pequeno, comumente associada a filhos de mães diabéticas.
✅ Conduta no Caso
O recém-nascido em questão eliminou um tampão de mecônio após estimulação retal com termômetro, seguido por evacuação abundante.
Caso isso não tivesse ocorrido, o próximo passo seria a solicitação de uma radiografia simples de abdome para avaliar a presença de níveis hidroaéreos ou dilatações intestinais sugestivas de obstrução.
📚 Referências
Clark DA. Time of first stool and urine in 500 newborns. Pediatrics. 1977;60(4):457–459.
Loening-Baucke V, Kimura K. Am Fam Med. 1999;60(7):2043–2050.
Stanford Children - Hirschsprung Disease
Ministério da Saúde. Diretrizes de Triagem Neonatal no Brasil.
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